sexta-feira, 8 de agosto de 2014

PRIMITIVE REASON - ENTREVISTA

Uma outra forma de experimentar, várias formas de abordar a necessidade de criar.
Mais do que despertar o culto de um passado glorioso, os Primitive Reason orgulham-se de uma carreira a redesenhar as fronteiras que confrontaram e a reinventar-se, à procura de consolidar o sucesso que foram obtendo e marcar ainda mais o panorama musical português nuns dormentes anos 90 e início dos 00s.
Nem sempre obtendo o mesmo reconhecimento que nos seus primeiros trabalhos, a banda de Guillermo de Llera, o único membro restante da formação original, apresentou no ano passado o regresso aos discos com "Power To The People". É precisamente a Guillermo que pedimos agora algumas pistas, respostas e visões sobre 20 anos de Primitive Reason.





BandCom (BC): 20 anos e 6 discos depois, como chegam os Primitive Reason a esta fase da sua carreira? Ainda são “a banda improvável vinda de um local improvável” como Cascais?

Primitive Reason (PR): Sim, ainda somos “a banda improvável vinda de um local improvável”, mas mais “aquela banda improvável vinda de um local improvável”.
Após um hiato de 5 anos os Primitive Reason voltaram com as forças redobradas e as ideias muito mais claras, como se pode ouvir no novo disco "Power to the People".
Chegamos num grande momento de forma a nível de inspiração e de motivação, e com a sorte de estar a trabalhar com uma equipa que nos percebe. A boa fortuna parece estar a acompanhar-nos e tem surgido muito interesse na banda vindo, principalmente, de fora, que dá a entender um futuro risonho, cheio de aventura e novas experiências.


BC: Portugal também mudou ao longo destes anos? Em que aspectos – não só económicos, mas sobretudo artísticos?

PR: Portugal, a nível artístico, modernizou-se um pouco. Parece haver um menor abismo entre o que se faz cá e muito do que se faz lá fora. Pode responsabilizar-se a Internet, o facto de que muito artistas portugueses "curtem" lá fora, ou o facto de que muitos artistas estrangeiros optaram por morar cá, no nosso país de tanto sol.


BC: O Cinema São Jorge foi a sala escolhida para em Março comemorarem a vossa longevidade. De que sala(s) ou festival(s) guardam as melhores memórias?

PR: Para mim o "nosso" primeiro Super Bock Super Rock em 1996 acho eu. Pela novidade daquilo tudo e pelo facto de partilhar palco com o David Bowie que, para mim, nos anos 80 simbolizava uma certa irreverência dentro do mercado pop.


BC: Como descreveriam este mais recente “Power To The People”? Mais do que uma simples mostra de vitalidade?

PR: "Power to the People", estilisticamente falando, é um "fechar do circulo"; um "voltar às raízes" e um "ponto de partida". Simboliza um novo início para os Primitive Reason, um renascer das cinzas...


BC: Apesar das mudanças na formação, o Guillermo manteve-se e parece que a sonoridade dos Primitive Reason também. Mesmo com um caldeirão de influências, vemos a banda a concentrar-se serenamente em registos, em ritmos, no grooveque lhe trouxeram bons resultados no passado embora não seja “mais do mesmo”. É assim?

PR: Pode descrever-se assim, sim. Sempre tive o cuidado de proteger bem as raízes sonoras dos Primitive Reason, e apesar de esta ser uma banda que arrisca muito propositadamente, sem medo de falhar, há um núcleo musical, um "core" que sempre mantivemos, como se pode ouvir em todos os discos. Como disse anteriormente, sendo este disco um "voltar às raízes" obrigatoriamente teríamos que revisitar certos géneros musicais. Mais do que fazê-lo porque nos trouxeram algum reconhecimento ou sucesso, fizémo-lo porque consideramos que esses géneros são um fenómeno local entre os Primitive Reason e Portugal, produto de um contexto cultural da música que é único entre Portugal e os PALOP, e que representam algo de original e importante. Falo claro, do que eu denomino o afro-tuga ou afro-ska.





BC: Este disco não é claramente dador de êxitos como os casos de “Kindian” e “Seven Fingered Friend” mas denota uma preocupação a cada momento com o detalhe. Tendo em conta a sua complexidade instrumental, a preocupação com o detalhe é um dever ou antes uma precisão para explorar mais caminhos, agarrar mais o ouvinte, fugir do mais fácil e acessível?

PR: "All of the above".
Este é o disco da consolidação e houve uma clara preocupação com o "fazer bem". Depois de 5 anos sem lançar um disco era importante frisar e relembrar que esta banda é uma banda a sério e não um projeto efémero. Igualmente importante era mostrar que a música pode "entrar bem" nos ouvidos sem ser demasiado simplista e sem recorrer sempre à mesma fórmula. Como o bom vinho, que nos diz tanto pelo sabor, os discos profundos, bem trabalhados e compostos também ganham com o passar do tempo.


BC: As reacções a este disco, por parte da crítica e do público que já tanto vos elogiaram anteriormente, têm ido ao encontro das vossas expectativas aquando da composição do seu alinhamento?

PR: Ainda tenho que ouvir alguém dizer que o disco não presta. Para mim significa que se soube perceber o disco porque, vamos ser honestos, há discos incompreendidos no seu tempo. Com isto não digo que o "Power to the People" é muito "à frente" e de difícil digestão, muito pelo contrário, estou sim a dizer que o estilo musical de Primitive Reason nada muito contra a corrente, e há alturas em que não há abertura de mercado para aceitar de bom grado a nossa proposta musical.


BC: O Bob Brockmann, que foi quem produziu o vosso último disco, é um contacto ainda dos tempos da vossa aventura pelos Estados Unidos ou é mais recente?

PR: O Bob é um contacto recente que surgiu por sugestão do nosso manager.


BC: Entre o “Some of Us” e o “The Firescroll” lançaram a vossa própria editora, a Kaminari Records, por onde ainda hoje lançam os vossos próprios discos. Alguma vez pensaram em também lançar discos de outros artistas pela Kaminari? O que pesou mais na sua criação: tentar escapar à crise da indústria ou tentar escapar às pressões que tentavam moldar a vossa carreira?

PR: Sobre lançar outros artistas pela Kaminari: sim, e nos próximos dois anos não só serão lançados vários projetos meus pela Kaminari, como também de outros artistas que sigam a mesma filosofia de "fazer a música pela arte".
Criámos a Kaminari precisamente para escapar às pressões que tentavam moldar a nossa carreira. A resposta ao "têm que fazer outro "Seven Fingered Friend" foi fazer o "Kindian". Sempre estivemos destinados a entrar em conflito com quem tentasse fazer fórmula de sucesso com esta banda porque uma parte inerente e importante dos espírito Primitive Reason é precisamente a irreverência contra os "Sistema" e os "Powers That Be" (até parece que estou a escrever uma letra).


BC: Até há pouco tempo parecia que os Primitive Reason estavam, sem razão aparente, a passar ao lado de uma maior carreira internacional. Todavia, também com o advento de novas formas de os artistas interagirem na e com a Internet, isso parece ter mudado muito rapidamente. Que planos têm para se mostrarem no exterior? É uma prova de que a Internet tem para os artistas tanto vantagens como desvantagens?

PR: A Internet tem quase só vantagens para o artistas. O velho sistema que existia no mundo da música não era vantajoso para os artistas. Por toda a sua dedicação, sacrifício, e esforço as bandas ficavam com menos de 10% dos lucros de um disco, e só recebiam esses 10% após recuperar todo o investimento feito pelas editoras. Era preciso destruir este sistema e, felizmente, a Internet proporcionou-nos isso. Agora o poder está na mão do artista de gerir a sua carreira "direct to fan".
Sobre os Primitive e a nossa carreira internacional: o "Power to the People" foi lançado na Alemanha e outros países circundantes, e estamos em via de lançar noutros países da Europa, no Brasil e nos Estados Unidos. Em Setembro estaremos em Espanha a tocar e a negociar o lançamento no nosso país vizinho.





BC: Tal como outros artistas com mais anos de experiência, sentem que a comunidade dos vossos seguidores, a “Primitive Tribe”, está também a crescer e a rejuvenescer-se? Por outro lado, sentem-se os pais de bandas como os Kumpania Algazarra ou Farra Fanfarra que vão entretanto surgindo?

PR: A "Primitive Tribe" é um verdadeiro fenómeno. Há pouco tempo fizemos um concerto um pouco atípico porque foi inserido numa feira do artesanato, com cadeiras para o público e aconteceu algo de inesperado. Todas as crianças passaram o concerto a dançar à frente do palco e acabaram por invadir o palco para fazer o concerto connosco. Alguns, filhos de uma geração anterior de fãs, outros porque se identificaram com o "lado primitivo" da nossa música, mas todos eles vibraram e contagiaram o resto do público.
Não somos necessariamente pais dessas bandas que são muito boas, diga-se já. O que fizemos foi ser a primeira banda nacional a sair completamente da caixa e fazer música que nunca se tinha ouvido em Portugal. De certa forma, e com toda a humildade, fomos responsáveis só por abrir a porta e mostrar outros caminhos. A responsabilidade e mérito de trilhar esses caminhos é inteiramente das bandas que o fizeram. Estão de parabéns todas as bandas que trouxeram algo de novo e enriqueceram a música portuguesa.


BC: Bem há pouco tempo os Zimun estiveram em Portugal a convite do Abel e do Guillermo. Como se conheceram? São colaboradores a contar para futuros discos?

PR: Sim e sim. Criámos uma afinidade tal com os Zimun que quando formos proximamente ao Brasil vamos visitá-los e, quem sabe, fazer estrada com eles. Estamos já a falar de fazer uma canção juntos mas os detalhes não podemos divulgar ainda.


BC: Quais as próximas datas já confirmadas para podermos ver os Primitive Reason ao vivo?

PR: 11 de Agosto - Carviçais Rock. 14 de Agosto - FUSING, Figueira da Foz. 24 de Agosto - Festas do Mar, em Cascais. Tudo grandes e bons concertos!


André Gomes de Abreu




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