domingo, 10 de agosto de 2014

GUTA NAKI - "Perto Como" (2014, Meifumado Fonogramas)

Na música portuguesa actual continua a haver espaço para um trio que sabe bem o valor que o tempo tem e, naturalmente, render estruturas prontas a desfazer em palco ora por uma voz incrível, ora pelo racional do virtuosismo lírico e instrumental. Se ainda se pode acreditar numa banda de carreira, os Guta Naki encarnam por completo a descoberta que expulsa o dogmático, o direitinho, o imutável de quem se quer manter único a tentar completar o exercício do passo seguinte. 





"Perto Como" é o segundo disco dos Guta Naki e as diferenças são claras: há uma concentração no que de pop e de orgânico era resquício no primeiro trabalho e, com isso, um ganho evidente de coesão ao longo de todo o trabalho. Há, nesse sentido, um plano de fuga ao sentido negativo do inesperado, alargando um espectro emocional sem o direccionar. Continua a perpassar por aqui o mesmo encanto despercebido, confessional, feito de um minimalismo dandy, de uma luminosidade misteriosa adestrada por um estoicismo carregado e, claro, pelo experimentalismo, musical e físico, de vários territórios. 
O problema principal é a contradição que surge para além de temas como "Meu Amor É Índio", "Zeferino" e "Terra de Ninguém", onde é devida a consideração pelas palavras e pelos bons créditos em carteira, e a sedução fatal por "O Homem Que Dança", que não é apenas um bom single ou uma boa canção: são 4 espectaculares minutos pop abertos, em suspenso, com uma das letras menos trabalhadas do disco. Em suspenso porque não há que sentir culpa pelo facto de não haver ali nos arredores do alinhamento paragens como esta e pelo facto de que o disco não conseguirá "crescer" mais do que a resposta que inconsequentemente tentaremos sempre dar ao dilema entre preferir os Guta Naki deste ou do anterior álbum e com mais ou menos minutos por cada um destes 10 temas novos. 





O valor está cá e estamos a falar do segundo disco de uma banda que já deu mostras de que a sua evolução será sempre no caminho de uma nova surpresa. A chatice com a herança, diferente ou ainda maior que a anterior, pouco interessa. A verdade é que, desta vez, há que esperar para ter mais que uma boa e ilimitada sombra. 

André Gomes de Abreu





0 comentários:

Enviar um comentário

Twitter Facebook More

 
Powered by Blogger | Printable Coupons