domingo, 6 de outubro de 2013

AINDA TENS QUE OUVIR #9 - F l u m e - "PASSEIO PELO TRILHO" (2012, Azáfama)




F l u m e é o nome da faceta musical de Joana Barra Vaz e “Passeio pelo trilho” o título do EP que lhe dá corpo. Elegantemente simples, este primeiro trabalho é um desfilar de canções artesanais que resultam num rendilhado com tudo no sítio, como só quem ama o que faz sabe fazer. São, portanto, canções íntimas, em que a guitarra acústica e a voz doce têm um papel central (um pouco a fazer lembrar Márcia) sendo depois envolvidas pelo tal rendilhado de coros, percussões e programações. Mas o mais interessante é não estarem presas por amarras de fórmulas pré-concebidas. Seguem o seu caminho, vão para onde têm que ir, são canções tudo menos quadradas. São redondas, quase podemos dizer (piscando o olho ao “Circle Songs” do aclamado Bobby McFerrin). E, acima de tudo, aparece uma grande letrista na música portuguesa.

“O Vento”, tema de abertura, é uma canção extraordinária que entraria num best of dos Clã com uma perna às costas - isto se as canções tivessem pernas. Um bom princípio, com uma grande letra para uma grande canção, impulsionada por opções de produção certeiras e sobretudo um grande final. “Vai”, single de apresentação do EP, começa com coros suplicantes a que se segue a súplica propriamente dita - “Respira, que é bem melhor viver sem nada…” - e que é o mote para mais uma lição de bem escrever de quem já o fez para nomes como TV Rural e Bernardo Barata - Diabo na Cruz, Feromona - que assina a produção do “Passeio pelo Trilho” juntamente com José de Castro.











A “Canção do Trilho” canta-se com uma melodia baseada numa escala pentatónica remetendo para Oriente que é primeiro trauteada por uma guitarra e depois por um coro infantil, com uma linha de fagote que faz a cama a um bonito dueto com JP Mendes (Capitão Capitão). Já o “Disfarce do Sol” leva-nos de volta a tempos em que palavras como “preocupação” ou “ responsabilidade” não constavam do campo lexical. Num registo pessoal (e por isso intransmissível) a cantora conta-nos de “um passeio qualquer, regressando entre as silvas, com as mãos sujas…”, “…fugindo do que não tem fuga”. 





Para o fim: “O dia traz nova maré e ela acorda na fé”, um mote que se repete ad aeternum e o "coro de marinheiros", apelidado pela autora, vai marcando presença porque, afinal, “toda a catraia tem o seu moço”.
“Catraia” tem o condão de dar um final condigno a um grande conjunto de canções. E nesta última talvez se torne ainda mais evidente uma clara influência da autora – a música popular brasileira. O corpo é diferente, os ossos os mesmos. Sem qualquer tipo de desprimor, porque ter um esqueleto com suplementos de cálcio de Chico Buarque é uma dádiva para qualquer ser vertebrado. 




Bernardo Branco Gonçalves






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